domingo, 14 de março de 2010

Ainda o PEC, sobre o desemprego

Segundo o que foi divulgado pela TSF é intenção do Governo reduzir aos subsídios de desemprego com vista a estimular o regresso à vida activa.

Temos muitos ângulos por onde analisar esta questão. É necessário saber, e com toda a certeza o governo estará munido de uma informação suficientemente clara para argumentar que a redução no subsídio, ou nas condições para a sua obtenção se traduz efectivamente num regresso à vida activa dos actuais desempregados. Sabem então qual o tipo de desempregados que temos e querem-nos de volta à vida activa.

Temos de considerar antes do mais que, os desempregados que têm efectivamente direito ao subsídio de desemprego não são nem de perto nem de longe a totalidade dos desempregados inscritos nos centros de emprego. O seu número é muito menor. Outra coisa a ter em conta é que nos centros de emprego não são os locais ideais para se procurar trabalho real, aquele que existe no dia-a-dia dos mercados de trabalho. Essas oportunidades têm de ser procuradas directamente junto das empresas ou, em alternativa, junto de outras empresas que recrutam nas mais diversas formas. O próprio mercado está estruturado de forma a privilegiar as empresas que prestam serviços nas áreas de recursos humanos em detrimento de uma espécie de mercado social de trabalho que constitui por si só uma utopia que apenas gera ilusões dos mais diversos teores. Assim sendo, temos de considerar se o mercado tem efectivamente capacidade para absorver estas pessoas se elas pretenderem regressar á vida activa. Não querendo trazer para este espaço de breve reflexão dados estatísticos, baseio-me no senso comum, com todo o erro que possa trazer, para afirmar que o mercado não tem essa capacidade. Mas, em conjunto com isso, existe um número considerável de desempregados, que o são de forma sistemática e que não querem de facto, ingressar na vid activa normal de trabalho. E isto pode suceder tendo como um dos possíveis motivos, a não exigência de provas concretas e palpáveis de que o indivíduo (porque a análise tem de ser caso a caso) procura realmente trabalho.

A primeira obrigação do Estado, e o trabalho é antes de mais um direito e assim tem de ser visto, é fazer com que os indivíduos entendam que as oportunidades não nascem em instituições já por si minadas de forma a serem ineficazes. Não existe um mercado social de trabalho porque existe um negócio muito bem estruturado e montado em torno destas questões na esfera privada. E assim sendo, é obrigação do Estado formar os indivíduos para que saibam como e onde procurar trabalho. Faz parte do exercício da cidadania. Para que exista um apoio no desemprego há que haver efectivamente uma situação de desemprego, mas também uma situação de procura e empenho nessa procura de alternativas no mercado. Tem este a capacidade de resposta positiva em muitos dos sectores mais atingidos? Acredito que não tem, de facto e aí sim, deve intervir de uma forma bem mais contundente.

Antes de mais, para distinguir os tipos de desempregados há que promover uma cultura de trabalho alternativo. Quem recebe subsídio de desemprego deve automaticamente estar sujeito a um programa de trabalho social. Claro que não pode ser obrigatório, seria mesmo inconstitucional. Contudo é muito mais fácil premiar com uma extensão de prazo e aumento do rendimento proveniente desse subsídio, aqueles que, procurando efectivamente trabalho, participam na vida social e das comunidades. Aqueles que à partida não aceitam esta solução, serão exactamente os mesmos que estacionam nos centros de emprego à espera que caiam do céu propostas de trabalho. Nestes casos deve haver aquilo que o governo agora sugere, uma redução com vista à reintegração ou integração na vida activa. Mas será que isso produz realmente resultados?

Há que separar desde logo as diversas tipologias de desempregados. Tem de ser visto de forma diferenciada os casos de desemprego involuntário em áreas de actividade que estão por si mesmas em decadência, ou em processos de deslocalização, por exemplo, esvaziando-se em muitos casos o tipo de funções exercidas e para as quais os indivíduos têm formação específica. Ou ainda o trabalho indiferenciado de indivíduos que não têm grande formação e cuja idade não permita o reingresso pleno ao mercado de trabalho até por questões discriminatórias desse mesmo mercado que não cabe aqui analisar. Sem essa diferenciação não é possível qualificar as vontades e cruzá-las com as capacidades de ambos, mercado de trabalho e indivíduos, corresponderem nas suas necessidades mais específicas. O estado tem como obrigação, não conseguir empregos, mas antes preparar as pessoas que efectivamente querem estar na vida activa e que por qualquer problema involuntariamente se encontram em situação de desemprego. Preparar com a informação, como já disse de quais as reais ferramentas ao dispor das pessoas para procurarem “existir” e “contar” para o mercado real de trabalho. Formar os indivíduos que estão à partida mais limitados e fragilizados para as áreas onde existem necessidades específicas quer no sector público quer no sector privado. Ao estado cabe proteger as empresas e os indivíduos adaptando a legislação de forma a premiar os esforços de ambos, empresas e indivíduos, através de incentivos ou reduções fiscais, por exemplo. Mas, um Estado que está empenhado nessa dupla protecção social, pode e deve, ao reduzir no subsídio de desemprego, constituir um fundo que vá complementar os vencimentos, ou seja um subsídio de reingresso que deve ser aplicado em conjunto com benefícios fiscais para os empregadores.

Não me parece ter sido essa a ideia ou ser essa a intenção do governo com esta proposta. Está aqui contemplada a parte do corte que, aparentemente, prejudica aqueles que não querem o regresso á vida activa, mas vai atingir muitos que t~em essa vontade e que por razões de vária ordem não conseguem ingressar ou reingressar no mercado real de trabalho. O Estado é responsável também pela não descriminação na selecção de pessoas nas organizações em função seja de que critério for, excepto a própria vontade de trabalhar.

Mais uma vez, com este tipo de medidas, o que sucede é que o mercado encolhe ainda mais. Não é por causa da redução do subsídio que surgirão mais oportunidades para os que querem, e não vão deixar de viver de expediente aqueles que o não querem.

Portugal, um pequeno país que viu reduzido ao mínimo o seu tecido industrial e que é um país pobre de recursos, dá-se ao luxo de ter políticas sociais que sustentam comunidades inteiras que apenas sobrevivem à custa de formas de parasitarismo social e nada faz para agir contra isso. Houve uma correcção ligeira nas atribuições dos rendimentos mínimos quando passaram a designar-se como rendimentos sociais de inserção. Em alguns casos estes rendimentos acompanham os subsídios de desemprego e temos famílias inteiras que vivem meramente das contribuições sociais.

Os conceitos que estão na génese dos rendimentos de inserção são não só correctos, como fundamentais numa sociedade moderna. Contudo, não podemos confundir rendimentos de inserção com rendimentos fixos de indivíduos, famílias ou comunidades que em circunstancia alguma participam activamente na sociedade contribuindo com o seu trabalho e os seus impostos.

A única forma que é transmitida pelos políticos e nomeadamente pelo poder para resolver esta situação é a aplicação de um critério arbitrário não diferenciando positivamente aqueles que desenvolvem esforços reais de obtenção de trabalho ou que têm condições particulares de limitação no ingresso no mercado real de trabalho.

Quer então parecer, se seguirmos esta linha de pensamento, que apenas se pretende aqui uma medida que não é correctiva nem se aplica apenas aos que não querem, mas antes arbitrária e não diferencia positivamente os que efectivamente querem estar na vida activa. Logo, acaba por ser mais um embuste político e económico pois não gera qualquer mais-valia para a sociedade, para as pessoas atingidas em concreto e para as empresas que efectivamente pretendem criar postos de trabalho e com condições realmente dignas para quem pretende trabalhar.

Esse é o outro prato da balança. As empresas têm de ser protegidas no seu esforço e na sua tarefa social de criar postos de trabalho (quando se trata efectivamente de uma tarefa social que pode e deve existir). E devem ser mais protegidas quanto menos limitativo é o vínculo laboral a criar.

Esta visão global é que deve servir de base a qualquer intervenção nas condições da atribuição do subsídio de desemprego pelo que considero errada a forma de colocar a questão pelo governo. Mais uma vez se cortam precisamente nos elos mais fracos da cadeia. É já um hábito estrutural mas altamente pernicioso do sistema político e económico em que nos têm feito viver.

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