quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Entre o inferno e a salvação...



A imagem tem 33 anos e representa o momento histórico da nacionalização da banca portuguesa pouco depois do 25 de Abril, de forma a assegurar que este sector terminasse com a sabotagem sobre múltiplas formas à economia nacional então em processo. As movimentações da banca tinham a intenção clara de inviabilizar a evolução política democrática pelo seu comprometimento com o anterior sistema e com as oligarquias reinantes.

António Borges, uma das mais importantes figuras da opinião económica e do PSD actual defendeu há poucos meses que deveríamos caminhar para a privatização do único banco do estado, a Caixa Geral de Depósitos. Ainda não se conheciam os acontecimentos últimos desta crise que agora assola os mais desenvolvidos redutos do neo-liberalismo. Esta ideia vem na mesma senda dos crimes económicos cometidos quando se privatizaram companhias como a Galp, a EDP ou a PT. Vem sobretudo em contra-corrente com a pouca-vergonha das soluções apresentadas para conter a sangria da actual crise financeira. No mesmo caminho que leva os contribuintes das nações mais afectadas a pagarem duramente a factura da irresponsabilidade criminosa de alguns no sector e de muitos na política. E, pasme-se, aqueles que tiveram as mesmas linhas de pensamento que este prestigiado economista.

Relembrar as nacionalizações de há 33 anos em Portugal serve apenas para ilustrar como aquilo que os ultra-liberais apontam como tendo sido o responsável pelo atraso do nosso país serve hoje de ferramenta para salvar o próprio sistema capitalista. Mas mesmo isso pode não chegar. O caso da Islândia é disso um exemplo. É o próprio estado que se encontra falido. Como é possível suceder uma crise desta envergadura num dos países mais ricos do mundo? Pior do que tentar chegar a uma resposta breve e simples é tentar compreender como é que pode a contracção de mais uma dívida perante a Rússia pode trazer a solução ao problema deste país.

Chegámos ao ponto em que temos de compreender que não podemos andar uma vida inteira a parecer algo que não somos. A viver bem às custas de um endividamento que nos pode cair em cima a qualquer momento ceifando-nos toda uma vida de trabalho e de esforço. Temos de compreender que, aconteça o que acontecer os responsáveis por toda esta confusão nunca serão sequer beliscados por esta crise. Os contribuintes pagarão a manutenção das suas fortunas. Aliás, é de pensar porque já se falam de tantas falências e de algumas “nacionalizações” de instituições financeiras e não se ouça rigorosamente nada sobre ricos a ficarem pobres. Nem vai suceder porque estes pobres, mas sobretudo as camadas intermédias, irão providenciar a manutenção das suas riquezas através destes processos fraudulentos de nacionalização que não são mais que o absorver das dívidas nas contas do estado para salvaguardar os interesses dos especuladores e das grandes fortunas.

À semelhança do que aconteceu no Portugal do pós-25 de Abril em que, no dia seguinte toda a gente passou a ser revolucionária até ao osso, mesmo os que sempre dormiram com o regime Salazar-Caetano, hoje todos os liberais escarnecem o neo-liberalismo e que sempre foram pela regulamentação dos mercados. Não nos iludamos. Os novos esquerdistas e direitistas com discurso de esquerda são da mesma laia que os que saíram do MRPP para a liderança da política e da intelectualidade de direita no Portugal actual. Eles sempre quiseram tudo desregulamentado e entregue aos mesmos patrões de sempre, os seus ou melhor ainda, eles mesmos.

Estes são os senhores que nos querem fazer crer que as nacionalizações do 25 de Abril eram más mas que as actuais são boas porque são a tábua de salvação do próprio sistema financeiro. Os mesmos que venderam por valores ridículos aos privados empresas públicas lucrativas e algumas delas monopólios. Os mesmo que sempre têm feito um finca-pé ideológico contra o intervencionismo estatal.

À esquerda tem de haver uma postura forme de salvaguarda da identidade ideológica da diferenciação entre os processos de nacionalização e o actual processo de fraudes de nacionalização de dívidas absorvendo no estado os falhanços e os irregularidades e irresponsabilidades assumidas pela alta finança e pela política sempre cooperante e conivente. A esquerda tem de manter firme a ideia de que a banca e os seguros têm sempre de ter uma âncora firme no estado.

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