quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Algumas considerações sobre as movimentações eleitorais

Havia prometido uma breve análise à convenção do Bloco de Esquerda, não por qualquer questão específica mas por me parecer ter sido o palco de uma alteração significativa de tom do Bloco. Por tom quero dizer, como se deve entender, o modo e a linguagem de intervenção política. Há aqui um desfasamento curioso mas que joga em favor do Bloco, mas também da esquerda em geral. Um desfasamento entre o Francisco Louçã de há cinco anos atrás e o de hoje, bem mais próximo da postura e linguagem autênticos dos tempos do PSR.

Talvez exista uma inspiração europeia nos movimentos mais recentes em França e na Alemanha com as esquerdas a tornarem-se verdadeiras dores de cabeça aos poderes estabelecidos. O movimento de unidade à esquerda representado pelo Die Linke ou as novas formações do género bloquista que estão a florescer um pouco por toda esta Europa dá algum alento a Louçã para este aparente anacronismo. O Francisco louçã de 2009 recua para um tom mais “esquerdista” (no mau sentido da palavra) mas ao mesmo tempo com uma postura e um conhecimento de causa amadurecido pela História e pelos anos que passaram por ele e o tornaram uma pessoa mais soft. Daí o desfasamento. Uma pessoa definitivamente mais madura nas suas opções políticas, mais desvinculado de um radicalismo esquerdista aparece precisamente com a velha linguagem do seu PSR.

Nada de difícil compreensão. Hoje ouve-se senhores do PS a falar de cortar benesses dos gestores e pensa-se que o PS está com o delírio da febre que em períodos de crise os ataca como doença rara ou mal ruim. O PS já se desfez da esquerda há muito mantendo alguns militantes em banho Maria para que não se ponha em causa o pluralismo na farsa totalitarista que representa a manutenção dos interesses do bloco central. Pelo menos é assim que lhes chamam. Para mim não tem muito de central. A seta está espetada bem à direita, mas conceda-se que a esquerda não está patenteada. E como diz Miguel Urbano Rodrigues, hoje não faz sentido a palavra esquerda ou esquerdista. Pode mesmo ter um significado altamente negativo. Hoje faz mais sentido o termo “progressista”. E no PS ainda há progressistas? Claro que sim. Não tenho quaisquer dúvidas quanto a isso. Mas essa base consciente progressista do PS está aninhada ante o medo de dar o passo seguinte rumo à tomada de posição que faça jus ao nome do seu partido. Têm medo de experimentar a criação e preferem viver na imitação do lixo social produzido pelos outros. Têm medo da palavra e muito mas da experiência revolucionária de ensaiar o socialismo. Não posso então, juntar neste pote os progressistas temerosos do PS com a renascida linguagem revolucionária acrescida da maturidade calculista do Bloco de Esquerda saído desta convenção. Eu diria que saiu reforçado porque não teve medo de afirmar o anti-capitalismo e o socialismo como caminho a trilhar para o futuro. O Bloco vinculou-se claramente à construção, à criação revolucionária do socialismo em Portugal.

Temos assim, a serem efectivos estes desejos e a serem reais estas intenções, não uma ideologia formada, não um seguidismo de qualquer “ismo” novo ou velho, mas uma hipótese interessante de projectar no futuro resultados eleitorais em alianças em sede legislativa com as outras forças progressistas mais clássicas, mais vincadas ideologicamente como o PCP no sentido de termos uma esquerda muito mais forte e muito mais influente.

Ora, PCP e BE são como água e azeite, contudo são forças inseparáveis para um caminho que se espera poder vir a ser percorrido. Não podemos conceber uma via socialista, um projecto revolucionário sem as concepções contraditórias mas complementares em determinados aspectos destas diferentes forças progressistas. Á excepção de pequenos floreados políticos e de alguns temas algo folclóricos, as bases assentam na mesma estrutura política, no mesmo princípio e nada existe de verdadeiramente fracturante entre estas duas forças políticas (na teoria, claro).

PCP e BE tomaram as opções correctas para os seus caminhos eleitorais. As convergências das forças progressistas devem ser pós e nunca pré-eleitorais. O anti-bloquismo do PCP e o anti-comunismo dos bloquistas são referências meramente clubisticas sem grande noção ideológica, como se pode depreender mesmo do resultado desta convenção bloquista. Há falta de pragmatismo e realismo no BE e muita ingenuidade na ideia de se poder construir sem resistência feroz um sistema alternativo, político e económico. O actual sistema e as forças no poder não o largam com a maior das facilidades. Este BE com a velha linguagem do PSR, mesmo ganhando eleições nunca chegaria a formar um governo. Ilusões quanto a isso podem ser fatais ao projecto social que, segundo as suas palavras ditas e escritas, se propõem empreender. Daí que todas as forças progressistas são necessárias para esse caminho que não será fácil mas que é, definitivamente, possível!

É possível desfazer a farsa totalitária PS/PSD mas o caminho é tortuoso. E é possível integrar todos nesse processo à semelhança das interessantes experiências europeias (ainda em fase embrionária) e na América latina já com evidentes progressos.

Aos progressistas que se refugiam no voto útil na farsa totalitária do PS/PSD é tempo de atirar fora o medo da construção de uma nova e diferente sociedade. É preciso devolver humanismo à sociedade. É preciso depositar os votos à esquerda para uma verdadeira alternativa socialista.

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