sexta-feira, 30 de maio de 2008

Sobre as movimentações à esquerda

É evidente que, para que possa haver uma séria alteração do rumo das coisas a esquerda tem de aparecer mais unida que dividida. É certamente um bom sinal que estas movimentações aconteçam justamente nesta altura em que ainda é possível forçar o PS a uma maioria simples (uma vez que outra coisa ainda não é alcançável). No entanto devemos ter algumas coisas em consideração. Um PS com maioria simples é muito mais tentado a governar com os partidos que lhe são política e economicamente mais próximos fazendo acordos pontuais aqui e ali mas sempre, ou quase sempre, à sua direita.

Mesmo tendo uma ligeira simpatia pela figura política de Manuel Alegre que vai aparecendo como consciência crítica da esquerda do PS gostaria de compreender como é que esta “aliança” algo forçada destas esquerdas tão diversas termina no dia das eleições. É que Manuel Alegre vai estar na mesma lista do mesmo partido a engrossar os números que deputados que irão dar forma ao governo socialista. Os eleitores não irão ter nos seus boletins de voto a hipótese de votar no PS de Sócrates ou no PS de Alegre. No final das contas o voto vai para a mesma maioria. Em conclusão a voz de Manuel Alegre é em absoluto uma das formas mais inteligentes do PS somar votos. Soma o dos contentes com a governação e soma o dos descontentes que nas horas difíceis votam em consonância com a estratégia do governo. E ninguém no seu perfeito juízo acredita que o PS possa retirar Manuel Alegre das suas listas, onde ele pode ser verdadeiramente útil à estratégia global do partido.

Ficaria seriamente mais impressionado caso Manuel Alegre e todos os outros históricos do PS fundassem um partido ou movimento próprios ou pura e simplesmente participassem nos movimentos os partidos que já existem à esquerda do PS mesmo que como independentes. Só assim faz efectivamente sentido esta movimentação. Caso contrário trata-se meramente de areia nos olhos dos eleitores. Acredito, que com boas e genuínas intenções mas sem resultado prático se tudo isto não se tornar em algo de palpável nas urnas de voto.

Acredito profundamente que deve caminhar-se para um entendimento progressivo das esquerdas socialistas mesmo que isso não se traduza numa aliança eleitoral convencional (que vejo como impossível por enquanto entre BE e PCP e que nem será desejável neste momento pela carga histórica e política dos dois partidos) mas que pode aparecer em forma de entendimentos sobre as principais questões onde existem amplos consensos. O PCP é uma força fundamental à esquerda sendo mesmo um dos pilares da construção democrática do nosso país. O Bloco de Esquerda é um movimento novo sem uma firme identidade ideológica e por isso mesmo com o álibi histórico de não ter estado do lado de quaisquer erros. Daí a grande dificuldade de compreensão destas duas esquerdas tão próximas e tão distantes. É que o Bloco alega pretender caminhar para um socialismo rejeitando todas as formas que este tem vindo a assumir. A negação da história, dos seus erros mas também dos seus avanços, do pragmatismo das alianças estratégicas com as forças que internacionalmente podem bloquear uma intervenção com vista a desmantelar qualquer hipotética alternativa socialista na “nossa Europa” é o que impede estas esquerdas de se entenderem mutuamente. Perante o agravamento da crise a nível mundial é fundamental, é mesmo uma obrigação destas esquerdas alcançarem um entendimento sob pena de perdermos a mais flagrante oportunidade histórica talvez de sempre.

No entanto vejo-me forçado a repetir o mote que me leva a esta intervenção reduzindo à nossa pequena realidade. A tal questão de saber o que as pessoas retiram desta “aliança” estranha de quem, na hora da verdade irá aparecer em lados opostos das escolhas eleitorais. Afinal, votar em Alegre é votar em Sócrates e no seu governo… será que vamos ter surpresas nesta matéria?

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